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sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Não existem drogas leves, mas sim, dependências e consequências muito pesadas




11 Razões para dizer Não às drogas "leves"

1ª - Cada dia que passa a comunidade científica menos aceita a divisão entre drogas “leves” e “duras”, por reconhecer que o efeito das drogas depende muito mais da idade e das características do hospedeiro que as recebe, do que das propriedades químicas delas próprias, podendo uma droga dita “leve” como a marijuana ou o haxixe, se consumida por um indivíduo de 14 anos, com toda a imaturidade própria da idade, ser muito mais gravosa que uma droga dita “dura” como a cocaína ou a heroína, se estivermos na presença de um adulto de 50 anos com uma vida pessoal e profissional bem estruturada.
2ª - Senão vejamos: o adolescente deve operar a passagem da infância à idade adulta.

Em lugar de se confrontar com a realidade, a fim de realizar a sua maturação psicológica e a sua adaptação, ele, através do consumo do haxixe ( droga por onde normalmente se começa ), vai refugiar-se num mundo imaginário.

Não esquecer que o desenvolvimento psicológico sofre um retrocesso desde o momento em que o indivíduo se torna um consumidor regular.

Os riscos são múltiplos e muitas vezes isso pode impedir o jovem de desenvolver as suas capacidades e de encontrar satisfações de outro modo que não seja através de drogas, mesmo que elas tenham a “inocência” do haxixe, não conseguindo deixar de andar de outra maneira que “de cabeça cheia” de qualquer coisa, nem que seja de álcool.
3ª - Isto já de si é perigoso, mas pode ser ainda mais, se fizer despertar aquilo que “dorme” dentro dele e que em muitos casos é preferível não abordar muito bruscamente neste período da vida.

Nós temos todos em nós predisposições psicológicas pouco conhecidas e avaliamos mal os riscos.

Por exemplo, se um adolescente tiver tendências psicóticas ou paranóicas, a tomada de drogas, mesmo que sejam “leves” como o haxixe, pode fazer sobressair esta estrutura e a sua personalidade dar assim irreversivelmente uma volta enorme do dia para a noite.*

* ( Excerto do livro “Ser herói para a heroína” do autor)
4ª - O fenómeno da “tolerância”, isto é, a necessidade de aumentar as doses para sentir os mesmos efeitos, empurra uma grande parte das vezes o consumidor de haxixe para a droga rainha – a heroína.
5ª - Heroína que é ainda muitas vezes a droga recomendada pelo “dealer“ que “esgotou” o stock de haxixe, e que “simpaticamente” anuncia à sua vítima, que para não ir de mãos a abanar, como ele (a) até é boa pessoa, daquela vez até lha dá de borla...
6ª - Para a generalidade das pessoas o “des” é interpretado como demissão, derrota, ou seja, convite para darem espaço às drogas nas suas vidas, para as aceitarem e se acomodarem a elas em detrimento do sentimento natural de aversão perante algo que, como se sabe, reconhecidamente modifica a disposição e os sentimentos, provoca dificuldades na atenção e na memória, aumentando as dificuldades em resolver problemas – com consequente quebra de rentabilidade escolar ou laboral – podendo afectar por último, mais tarde, a sua personalidade.
7ª - Dizer que uma maior disponibilidade das drogas e a sua aceitação sócio-legal, não iria aumentar o seu uso, seria, pensamos nós, desafiar a natureza humana.
8ª - Para nós, a mensagem que a descriminalização das drogas leves transporta é que se o seu uso é benevolente então é porque não faz mal!

“Se fossem assim tão más elas não seriam descriminalizadas” seria esse, a nosso ver, o pensar de uma grande parte das pessoas!
9ª - Como corolário lógico, não espanta que tenha aumentado substancialmente o número de consumidores de haxixe (segundo o relatório do I.N.A., entre 1999 e 2004 registou-se um aumento de 46% entre indivíduos em idade escolar ) dos quais, com muita probabilidade, alguns deles, como se traduz no ponto 4º, irão engrossar mais tarde o pelotão dos consumidores de cocaína e heroína, aumentando exponencialmente as listas de espera das unidades de tratamento de toxicodependentes.
10ª - Com a descriminalização, em 2001, ao contrário do que muitos calcularam, não se reduziu a criminalidade directamente associada à droga.

Pelo contrário, registou-se um aumento de 9% nos últimos anos como referiu o relatório do I.N.A.

Porquê? Porque as pessoas continuaram a cometer crimes sobre a influência das drogas e continuaram a precisar de dinheiro para as comprar.

E como o consumo aumentou – por uma maior aceitação sócio-legal – não deixa de ser então lógico pensar que o crime o tenha acompanhado exponencialmente.
11ª - Com a aprovação da lei em Portugal que em Julho de 2001 descriminalizou o consumo, a posse e a aquisição para o consumo de todas as drogas, dever-nos-emos consciencializar que vai ser cada vez mais complicado pretender que alguém que se debata no terreno com um problema de toxicodependência procure com a brevidade desejável ajuda, por deixar de sentir suficientemente obstacularizado o seu comportamento, por ver removido por quem deveria olhar por si, o ónus da sua atitude desviante, dando-lhe a entender que até 10 doses, como estipula a lei,... tudo bem meu!
Nota do autor: Se considerarmos que, como poderia dizer La Palisse, o combate do problema da toxicodependência passa pela redução do número de toxicodependentes... , então parece-nos a nós que será dificultando a obtenção das drogas, reforçando uma correcta educação anti-droga e melhorando as condições dos actuais consumidores pela exigência de um tratamento sustentado no conhecimento e compaixão, que conseguiremos cumprir o nosso papel enquanto cidadãos.

Se considerarmos este (quanto a nós) despudorado convite para o abismo, assinado já há uns anos pelos governos do nosso país, então a fórmula de sobrevivência que propomos para fazer face ao seu depressivo cinismo, é agarrar aquilo que agora, como ontem como sempre nos pode valer, ou seja, as balizas orientadoras constituídas pelas causas, pelos valores e pelos princípios, condimentos que estimularão depois as verdadeiras e naturais ligações emocionais, virando as pessoas umas para as outras, induzindo nelas sensações satisfatórias de eficácia e diversão e um racional sentido de responsabilidade por si e pelo próximo, ajudando-as a encontrar dessa forma um sentido real para a autenticidade da sua existência.

Manuel Pinto Coelho
(Presidente da APLD)

Manuel Pinto Coelho
Licenciado em Medicina e Cirurgia pela Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e Director Clínico do Serviço Médico Permanente S.A. desde 2003. Desempenhou funções em diversos organismos privados ligados à problemática da droga e é presidente da Associação Para Um Portugal Livre De Drogas(APLD) desde a sua fundação em Julho de 2004. É autor de vários livros dedicados à temática da Toxicodependência.

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