Há cerca de seis ou sete anos deixei de comer
carne, tendo reduzido os alimentos de outra natureza animal praticamente ao
peixe, pois por vezes é socialmente difícil optar por uma alimentação
vegetariana. Mas apesar de as pessoas do meu círculo de amizades e familiar já
se irem habituando a esta minha opção (às vezes é como Pessoa dizia da
coca-cola: “primeiro estranha-se, depois entranha-se”) o certo é que continuo a
ouvir aquela pergunta, emoldurada por um olhar de preocupação pela minha saúde
e de espanto: mas porque é que não comes carne?
Para responder a esta pergunta dou normalmente
três tipos de justificação: a questão ética, pelo respeito da dignidade animal,
colocada numa dimensão mais filosófica ou espiritual; a questão de saúde, pois
a carne que ingerimos está cheia de substâncias nocivas à saúde, como comprovam
os valores incrivelmente mais baixos que passei a ter de colesterol, desde que
a bani da minha alimentação, assim como o leite e seus derivados; a questão ambiental,
pois a indústria agropecuária é das indústrias mais poluentes do planeta e a
que mais contribui para a camada de ozono, com todas as consequências que estão
à vista nas alterações de clima.
Mas podia reduzir todas estas explicações a uma,
bem mais simples e poderosa: não consigo comer nada, que me faça lembrar um
olhar. Quando era miúda sempre ouvi dizer que os olhos são o espelho da alma.
Muito cedo diziam-me que no olhar de alguém se vislumbra o seu íntimo, intui-se
o que lhe vai na alma. Até há aquela música que diz que “já vi o mar, no fim do
olhar de uma mulher!”. Pois bem: e quanto ao olhar de um animal? Já olharam bem
no fim dos seus olhos? O que veem? Uma coisa? Uma peça de carne, pronta a ser
esquartejada de diversas formas, consoante o seu fim, ora seja para cozer,
grelhar, estufar, etc…? Não.
Quando olho nos olhos de um animal, e para isso
treinei-me bem no olhar dos animais de estimação que me acompanham nesta vida,
sinto uma alma, uma expressão do Criador, um Ser que exprime em cada pestanejar
dor, afecto, alegria e gratidão como nenhum outro. Vejo-lhe a alma no fundo dos
seus olhos e essa visão começou, certo dia, a ser insuportável no momento de
olhar para uma peça de carne no prato. Esta é a razão mais simples e mais
poderosa de ter deixado de comer carne e outros alimentos de origem animal.
Marta Sobral
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